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29 de junho de 2018

Os minérios estratégicos brasileiros e a guerra comercial EUA-China

por Marco Gonzalez


A águia americana e o dragão chinês

EUA e China são protagonistas da atual guerra comercial mundial e figuram como importantes parceiros comerciais do Brasil. Aqueles dois países têm significativas reservas e produções de alguns dos principais recursos minerais de interesse brasileiro. Quais seriam esses recursos e como as negociações comerciais entre EUA e China, quanto ao setor mineral, podem afetar o Brasil?


Recursos minerais de interesse brasileiro

Plano Nacional de Mineração 2030, do Ministério de Minas e Energia, trata do conceito de "mineral estratégico" associado a objetivos políticos e faz referência a três situações. 
  • A primeira está relacionada à dependência de importação e são incluídos neste grupo potássio, nitrogênio e fósforo com forte impacto na balança comercial. O carvão metalúrgico também é lembrado nesta situação. 
  • O segundo caso é o dos minerais "portadores do futuro" que deverão ter importância crescente nas próximas décadas devido a aplicações de alta tecnologia, como é o caso de terras-raras, lítio, cobalto e tântalo. 
  • Na terceira situação encontram-se os recursos minerais essenciais à economia do país, como o ferro e o nióbio, pela importância dos mesmos na exportação.
Os Informes Minerais do primeiro e do segundo semestre de 2017, do DNPM, relatam dados do comércio exterior da Indústria Extrativa Mineral naqueles períodos apresentando as principais substâncias minerais brasileiras com maior volume na importação e/ou na exportação. Neste relato, além daqueles recursos minerais citados no Plano Nacional de Mineração 2030estão incluídos outros sete.

Conforme ainda o Plano Nacional de Mineração 2030, parece razoável também incluir o molibdênio como mineral de interesse brasileiro enquanto não ocorrer a entrada em operação do projeto de cobre de Salobo, no Pará, com produção de molibdenita como subproduto. Atualmente, o Brasil depende da importação de concentrado ustulado de molibdenita, com importações anuais da ordem de US$ 200 milhões. 

Considerando esses critérios, a lista dos recursos minerais de interesse brasileiro (daqui em diante "minérios estratégicos brasileiros") se completa com alumínio, caulim, cobalto, cobre, enxofre, ferro, fosfato, lítio, manganês, nióbio, nitrogênio, ouro, potássio, tântalo, terras-raras e zinco, além de petróleo e carvão mineral devido às suas importâncias em nível energético.

Reservas e produção

A tabela a seguir informa produções e reservas de EUA, China e Brasil em relação ao minérios estratégicos brasileiros. A grande maioria destes recursos estão presentes com produções e reservas significativas nos dois países parceiros do Brasil.


Recurso
mineral
EUA
China
Brasil
P
R
P
R
P
R
alumínio
740
a2.000
32.600
a44.500
800
a1.400
carvao
371
250916
1747
138819
3
6596
caulim
5.500
?
3.200
?
b2.100
?
cobalto
0,650
23
i
i
i
i
cobre
1.270
45.000
1.860
27.000
i
i
enxofre
9.660
?
17.800
?
530
?
ferro
28.000
c760.000
210.000
c7.200.000
280.000
c12.000.000
fosfatod
27.700
1.000.000
140.000
3.300.000
5.500
1.700.000
lítio
i
35
3
3.200
0,2
48
manganês
i
i
2.500
48.000
1.200
120.000
molibdênio
44,6
2.700
130
8.300
i
i
nióbio
i
i
i
i
57
4.100
nitrogênio
10.500
?
46.000
?
1.000
?
ouro
0,245
3
0,44
2
0,085
2.4
potássio
480
e210.000
6.200
e360.000
300
e24.000
petróleo
15,6
35427
4,8
25627
3,4
12634
tântalo
i
i
i
i
0,1
34
terras-raras
i
1.400
105
44.000
2
22.000
zinco
730
9.700
5.100
41.000
i
i
EUA, China, Brasil e os recursos minerais de interesse brasileiro: produção (P) e reserva (R)
Produção e reservas (fonte: USGS), exceto carvão (fonte: BP) e petróleo (fontes: IN e OGJ)
Valores em mil toneladas, exceto carvão (produção em milhão de toneladas de óleo equivalente; reserva em milhão de toneladas) e petróleo (produção em milhão de barris por dia; reserva em milhão de barris)
i = valor insignificante; ? = valor não disponível
a = capacidade no final do ano; b = produção beneficiada; c = Ferro contido;
d = rocha fosfática; e = K₂0 equivalente; 

Na próxima tabela, EUA, China e Brasil são classificados de acordo com o ranking de produções e reservas mundiais dos minérios estratégicos brasileiros. É possível observar que a China se destaca como principal produtora de sete destes recursos.


Recurso
mineral
EUA
China
Brasil
P
R
P
R
P
R
alumínio
12º
10º
caulim
-
-
-
cobalto
12º
12º
-
-
-
-
cobre
-
-
enxofre
-
-
23º
-
ferro
12º
fosfato
11º
lítio
-
manganês
-
-
nióbio
-
-
-
-
nitrogênio
-
-
27º
-
ouro
10º
potássio
10º
12º
12º
tântalo
-
-
-
-
terras-raras 
-
zinco
-
-
Ranking mundial dos três países quanto à produção (P) e a reserva (R) de cada um dos recursos minerais (fonte)

A próxima figura, considerando apenas os minérios estratégicos brasileiros, apresenta a produção em dólares de EUA, China e Brasil em 2017. Novamente o volume de produção da China se destaca.


Produção dos principais minérios estratégicos brasileiros por EUA, China e Brasil em 2017
(fonte1, fonte2, fonte3, fonte4, fonte5), exceto carvão e petróleo.

Exportações e importações

No total dos produtos comercializados, em 2017, os dois principais parceiros comerciais do Brasil foram a China, com 21,8% do total das exportações brasileiras (US$ 47,5 bilhões) e os EUA, com 12,4% (US$ 27 bilhões).

Em 2017, no setor mineral, o Brasil exportou US$ 22,4 bilhões em minérios, escórias e cinzas (10,3% das exportações totais), US$ 18,7 bilhões em combustíveis minerais, incluindo petróleo (8,6% do total) e US$ 10,8 bilhões em ferro e aço (4,9% do total exportado)

A figura a seguir mostra a movimentação comercial dos minérios estratégicos brasileiros, com exceção de petróleo e carvão, entre o Brasil e os parceiros EUA e China.


Principais recursos minerais importados e exportados pelo Brasil de/para EUA e China
(fontes: ANM, ANM1, ANM2MME e MDIC)
"Nióbio" refere-se a ferronióbio e inclui comercializações de tântalo, vanádio e zircônio.
"Outros" refere-se ao restante dos minérios estratégicos brasileiros, exceto carvão e petróleo.

Em 2017, considerando a totalidade dos países parceiros, as importações brasileiras de carvão alcançaram o valor de US$ 3,6 bilhões (fontes: ANM1 e ANM2). Em relação aos EUA, o Brasil tem importado mais de US$ 1 bilhão por ano de carvão. 

Também em 2017, o setor brasileiro de petróleo e derivados teve superávit de US$ 3,681 bilhões. Os EUA importou do Brasil 186 mil barris por dia de petróleo bruto em média em 2017. 

faturamento brasileiro, em 2017, foi de R$ 8,3 bilhões em 4,7 milhões de toneladas de aço vendidos aos americanos. Um terço do aço exportado pelo Brasil tem tido como destino os EUA. 


Mina de ferro de Carajás, Pará, da Vale, importante fornecedora de minério de ferro para produção de aço (Foto: NASA)

Do total dos produtos brasileiros exportados para os EUA, 59,7% são industrializados. Do Brasil para a China esta proporção é bem menor: 2,78% dos produtos exportados são manufaturados. A fatia dos produtos básicos (onde se inserem os minérios estratégicos brasileiros) foi de 13,6% do total exportado do Brasil para os EUA.

Entre EUA e China

No início de junho, na terceira rodada de negociações com os EUA em Pequim, a China propôs comprar quase US$ 70 bilhões adicionais (um acréscimo de 53,8%) em bens americanos para que os EUA abandonem a imposição de tarifas em US$ 50 bilhões de produtos chineses. O déficit comercial de bens importados pelos EUA da China foi de mais de US$ 375 bilhões em 2017.

A economia dos EUA, porém, tem uma importante proteção devido ao comércio interno daquele país ser significativo. As exportações americanas representam cerca de 12% da sua economia. Na China esse valor chega a quase 20% e é a maior importadora de carvão e petróleo no mundo. Este pode ser um fator de peso para uma queda de braço favorável aos EUA.

Entretanto, de forma recíproca, China e EUA têm anunciado tarifas para produtos de cada lado pelo valor de 50 bilhões, além de ameaçarem com rodadas ainda mais volumosas.

E o Brasil?

O Brasil e os EUA continuam as negociações sobre isenções de tarifas de importação para aço e alumínio.

Na avaliação dos analistas da área, uma guerra comercial entre EUA e China trará ao Brasil mais efeitos negativos que positivos. No início de junho, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) estimava que as exportações de aço teriam um prejuízo de US$ 3 bilhões e as de alumínio US$ 144 milhões.


Embarque de bauxita (origem do alumínio) da Mineração Rio do Norte no rio Trombetas, município de Oriximiná, Pará (por Carolina Franco)

Um estudo da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad) concluiu que, no pior cenário de uma guerra comercial entre 124 países, as tarifas médias aplicadas às exportações brasileiras poderiam subir de 5% (valor atual) para 32%.

Com as medidas comerciais anunciadas pelos EUA, avalia-se que a China será a maior prejudicada, quanto ao aço, pois é grande consumidora mundial e a maior produtora (mais de 50% do aço produzido no mundo) deste produto. Neste sentido, o Brasil também seria bastante afetado, pois é o segundo maior exportador de aço para os EUA e o primeiro em aço semiacabado. O carvão deve ser o principal elemento a entrar nessas negociações com os EUA, pois o carvão americano é essencial para a indústria brasileira. Caso as medidas de proteção se efetivem, o Brasil terá uma queda de 30% nas exportações para os EUA e deverá concorrer com a China e a Rússia por novos mercados.

No cenário global, os preços dos metais têm recuado devido ao temor do agravamento dessa guerra comercial. Vamos aguardar para ver se o Brasil será parte da solução nestas questões ou se fará parte do problema.

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